‘O papel do Estado não se mede pelo tamanho, mas pela eficiência’, diz Levy

Segundo o ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do BNDES, o Congresso e o governo encontrarão juntos uma saída para reduzir a dívida pública do país

A equipe econômica de Paulo Guedes sofreu uma debandada nesta semana. Na terça-feira (11), Salim Mattar e Paulo Uebel pediram demissão das secretarias de Desestatização e Privatização e Desburocratização, Gestão e Governo Digital, respectivamente. Agora, sob ameaça de uma nova onda de demissões, o Ministério da Economia tenta reforçar a agenda liberal e, de alguma maneira, a importância do teto de gastos. 

Entre os principais dilemas atuais do governo, há a questão de como manter e até mesmo expandir programas sociais, sem infringir o teto de gastos – principalmente diante de um ambiente recessivo.

Para o ex-ministro da Fazenda e atual diretor de estratégia econômica e relações com mercados do banco Safra, Joaquim Levy, o desafio do governo é continuar dando apoio a população mais vulnerável, mas de forma proporcional à capacidade da economia – e dentro de um quadro que conseguimos manter no longo prazo. “Olhando para a frente, entendemos que o Congresso e o governo vão encontrar uma equação para reduzir a dívida pública.” 

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Mais que isso, Levy, que também ocupou o cargo de presidente do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) durante o início do governo de Jair Bolsonaro – pediu demissão em junho do ano passado –, avalia que o papel do Estado em um momento como esse não e mede pelo tamanho, mas pela eficiência e capacidade.

“Por isso temos que investir em educação, principalmente agora que caminhamos para um cenário de economia da informação. E a educação é capaz de mudar e transformar isso”, afirmou o ex-ministro. 

Atualmente, a estimativa da equipe econômica para o buraco fiscal das contas públicas em 2020 é de R$ 812,2 bilhões – coniderando um cenário de queda do PIB em 4,7%. O valor do déficit primário é equivalente a 11,3% do PIB para o ano. Entre os destaques do enfrentamento da pandemia, e da elevação da dívida pública, está o está o auxílio emergencial que, pelo lado das despesas, soma um gasto de R$ 254,2 bilhões.

Como exemplo bem sucedido de programa social, Levy destaca a eficiência e progresso do Bolsa Família. Segundo o diretor do Safra, o Bolsa Família tem bons números por não criar despesas obrigatórias muito grandes, ser focada em um objetivo específico e olhar para o longo-prazo. 

Ainda, segundo Levy, é necessário encontrar o equilíbrio fiscal, pois se trata de uma questão que afeta e preocupa todas as nações no mundo. Para o Brasil, o tema é ainda mais delicado, já que atualmente o país tem menos margem quando comparado a outros.  

“Sabemos a importância do auxílio emergencial. Agora, é o momento de transição. Temos que estar atentos até na velocidade que a economia for voltando, modulando [o programa] para ter a posição certa. Continuar dando o apoio, mas proporcional a situação fiscal do país”, analisa. “Será importante que as condições favoráveis se mantenham, até para mantermos a confiança do mecado.” 

Um Congresso receptivo

Embora a equipe econômica esteja enfrentando baixas nos últimos dias, Levy avalia que o risco político no Brasil ainda está baixo, principalmente pelo Congresso atual estar caminhando ao lado do governo. Para o ex-ministro, mesmo em meio a polarizações, o país conta com um ponto positivo: a tradição de saber conversar e construir.

“Já estive no governo e já vi um Congresso que não era favorável a cooperação e as reformas. Agora, o cenário é outro”, relembra. “Termos confiança de que dá para fazer muita coisa.” 

Como exemplo, Levy cita a abertura da Câmara em relação à reforma tributária, o que traz um sinal muito positivo para as outras reformas e marcos regulatoórios que estão por vir. 

Já quando indagado sobre a volta de um imposto similar à CPMF, Levy é criterioso: “é preciso ver como as reformas vão evoluir. Aí teremos mais condições para julgar se é hora de uma CPFM, ou não.” 

A recuperação será em V

Para Levy, a economia já demonstra sinais claros de recuperação, principalmente com os indicadores referentes aos meses de reabertura – como junho e julho. Recentemente, a indústria apresentou alta de 8,9% em junho, quando comparado a maio. Embora não tenha revertido as perdas provocadas pela pandemia do novo coronavírus, o avanço ocorreu em 24 setores, dos 26 pesquisados. 

“O crescimento da indústria veio mais alto do que o mercado esperava e foi muito positivo para nós”, diz Levy. “Avaliamos que a recuperação será em V, que é como quando você está embaixo d’água e quer subir. Você ganha uma aceleração para sair da água, mas depois estabiliza, não sairá voando”, diz. 

Além disso, o setor de serviços, que teve quatro meses consecutivos de queda, apresentou uma alta de 5% em junho – um dos últimos índices a demonstrar recuperação após o isolamento social. 

Diante desse panorama, o economista avalia que o PIB brasileiro sofrerá um tombo de 5,5% em 2020, uma retração menor que a prevista pelo mercado no Boletim Focus, que após nove revisões, está em 5,62%. Já em 2021, Levy avalia que a economia brasileira engatará para o crescimento e deixará o ambiente recessivo. 

Entre os setores de destaque que puxarão a retomada, Levy aponta a construção civil, saneamento e, principalmente, o e-commece, que cresceu diante do isolamento social e ganhou protagonismo durante a pandemia. 

“Temos uma chance de voltar a níveis próximos do ano passado e continuar crescendo, de modo que a gente consiga ver um crescimento positivo em 2021 – em relação a 2019. Estamos vendo a retomada com com otimismo”, conclui. 

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