Nova Zelândia registra queda em novos casos de COVID-19 pelo quarto dia seguido
País aposta em medidas de isolamento e manterá quarentena mesmo com declínio de casos da doença.


A Nova Zelândia conseguiu realizar algo que muitos países estão tentando: por quatro dias consecutivos registrou um declínio nos novos casos de coronavírus.
Na quinta-feira (9), o país registrou 29 novos casos prováveis e confirmados, elevando o total para 1.239 – sendo apenas uma morte. Destes casos, apenas 14 estão no hospital – e 317 já se recuperaram.
A Nova Zelândia, um pequeno país insular com uma população de menos de 5 milhões de habitantes, está na metade de um isolamento de um mês que visa não apenas conter o vírus, mas eliminá-lo. E até o momento, a ação parece ser um sucesso. “Estamos virando a esquina”, disse a primeira-ministra Jacinda Ardern em discurso na quinta-feira. “E seu comprometimento significa que nosso plano está funcionando”.
Para outros países, esses sinais positivos podem ser um motivo para aumentar as restrições. A Dinamarca, que tem pelo menos 5.597 casos e 218 mortes, anunciou que começará a suspender o bloqueio na próxima semana se os casos permanecerem estáveis.
Em vez disso, Ardern disse na quinta-feira que estava reforçando as restrições nas fronteiras, o que significa que todos os que chegarem ao país deverão passar duas semanas em quarentena em uma instalação aprovada, em vez de se auto-isolarem em casa. A regra só se aplica aos neozelandeses – os estrangeiros foram proibidos de entrar no país desde 20 de março.
“Na metade do caminho, não hesito em dizer que o que os neozelandeses fizeram nas últimas duas semanas é impressionante”, disse Ardern em entrevista coletiva na quinta-feira. “Você tomou a decisão de que juntos poderíamos proteger um ao outro. E você o fez. Você salvou vidas”, falou aos espectadores do país.
No avanço da Nova Zelândia na luta contra o coronavírus, o país teve duas vantagens principais: a geografia e o tempo. Em 28 de fevereiro, a Nova Zelândia confirmou seu primeiro caso de coronavírus, bem mais de um mês após os Estados Unidos confirmarem seu primeiro caso. E em 29 de março, o país confirmou sua primeira – e até agora única – morte.
“Acho que tivemos um pouco mais de tempo para pensar sobre isso e pudemos aprender com a experiência da China”, disse o professor Michael Baker, do Departamento de Saúde Pública da Universidade de Otago, que ajudou a aconselhar o governo.
A Nova Zelândia também teve a vantagem de ser uma ilha distante da maioria dos outros países, com menos voos do que muitos outros lugares, disse o microbiologista da Universidade de Auckland, Siouxsie Wiles.
Isso é algo que Ardern apontou. Na quinta-feira, ela observou que ser uma ilha era “uma vantagem distinta em nossa capacidade de eliminar o vírus”.
Mas a verdadeira lição da Nova Zelândia tem sido a combinação de boa ciência e liderança, disse Baker. Isso significa testes generalizados. Até o momento, a Nova Zelândia realizou 51.165 testes. No início desta semana, o Reino Unido – um país com cerca de 13 vezes mais pessoas que a Nova Zelândia – afirmou ter testado 208.837 pessoas.
Baker disse que ficou “realmente decepcionado” com o fato de países como os EUA e o Reino Unido, que tinham alguns dos principais recursos científicos do mundo, não terem se saído melhor do que países como a Nova Zelândia, que têm recursos comparativamente limitados. “Temos o mesmo acesso ao mesmo conhecimento que você – o mundo todo já viu isso acontecer, é como um tsunami lento, não mudou suas características e o vírus é muito estável”.
Enquanto o primeiro-ministro britânico Boris Johnson alertou os cidadãos de que eles deveriam se preparar para perder entes queridos antes do tempo, Ardern deixava claro que ela valorizaria as pessoas, não apenas a economia, e respondeu à ameaça rapidamente, disse Wiles.
Quando Ardern anunciou em 14 de março que qualquer pessoa que entrasse no país precisaria se auto isolar por duas semanas, estava entre as mais severas restrições de fronteira do mundo. Na época, o país tinha seis casos.
Em 19 de março, Ardern proibiu a entrada de estrangeiros no país, na ocasião haviam 28 casos confirmados. E em 23 de março, quando Ardern anunciou que o país estava entrando em confinamento, haviam 102 casos confirmados – e nenhuma morte.
“Aqui na Nova Zelândia, não temos muitos leitos de terapia intensiva em comparação a outros países. É por isso que (Ardern) agiu muito rápido”, disse Wiles.
Por que a Nova Zelândia tem apenas uma morte
Outro fator que a Nova Zelândia tem que está trabalhando a seu favor é a relativa juventude daqueles que foram infectados com coronavírus. Pessoas entre 20 e 29 anos representam pouco menos de 25% dos casos prováveis e confirmados da Nova Zelândia, enquanto aqueles entre 30 e 39 anos representam 15%.
Em comparação, um relatório publicado pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA, que analisou os casos de 2.500 pacientes nos EUA cujas idades eram conhecidas, descobriu-se que 29% tinham entre 20 e 44 anos.
Países em todo o mundo têm visto consistentemente uma taxa de mortalidade por COVID-19 muito maior entre pacientes idosos do que pacientes mais jovens.
A razão pela qual os jovens da Nova Zelândia podem ter uma taxa mais alta de coronavírus são as viagens. Pouco mais de 40% dos casos da Nova Zelândia ainda estão relacionados a viagens ao exterior. Muitos jovens voltaram às pressas para a Nova Zelândia depois que Ardern anunciou restrições nas fronteiras.
Baker disse que esse era o “efeito de viajante saudável”.
“As pessoas que viajam geralmente têm melhor saúde do que a maioria das pessoas. Sabemos que o risco de mortalidade é muito maior em populações mais velhas e em pessoas com condições crônicas e elas tendem a viajar menos”, afirmou. “Os resultados muito bons até agora na Nova Zelândia são os casos em faixas etárias mais jovens e relativamente saudáveis”.
A Nova Zelândia pode ter sucesso em eliminar o coronavírus?
Certamente, há razões para ser cautelosamente otimistas de que o plano da Nova Zelândia está funcionando – mas Wiles e Baker concordam que é muito cedo para comemorar. Ardern disse que não tem planos de suspender o bloqueio de um mês mais cedo e pode precisar prolongá-lo ainda. “Se mudarmos isto muito cedo, voltaremos”, disse ela na quinta-feira.
Enquanto o plano A continua “carimbando” o coronavírus, existe um plano B, disse Baker. Isso envolve a preparação do sistema de saúde para um grande número de pessoas gravemente doentes, disse. E mesmo que o plano A funcione, a Nova Zelândia ainda terá que permanecer uma ilha, por assim dizer, por algum tempo ainda. “Estaremos no mesmo barco que a maioria dos países que adotam a abordagem de supressão – aguardaremos boas vacinas e bons antivirais”, disse Baker. “Grande parte da Europa está dizendo que ficaremos presos por meses, então estamos todos no mesmo barco”.
Ivan Watson e Rebecca Wright da CNN, contribuíram com reportagem de Hong Kong.